Uma data que nunca guardo, mas hoje é dia dos avós, e resolvi escrever sobre essas pessoas fofas, que todos nós esperamos nos tornar um dia. Não conseguirei fugir do clichê de que avós são pais duas vezes, e muito menos de que "casa de vó" é um dos lugares mais maravilhosos que existe. Todos nós temos quatro deles, alguns tem a sorte de ter mais que isso, muitos não conhecem os quatro, às vezes nenhum, mas espero que encontrem alguém para lhe dar este carinho, este colo gostoso.
Eu não conheci meu avô paterno, na verdade meu pai pouco o conheceu também, o perdeu aos 13 anos de idade, porém nunca conviveu com ele. Não, ele não abandonou a família, ele sofreu com uma doença muito triste da época, a lepra (ou hanseníase), que as pessoas julgavam infecciosas e o obrigou a se afastar de todas as pessoas que amava. Sempre penso nele, neste sacrifício horroroso ao qual ele foi obrigado a se submeter. Meu pai, o caçula dos 5 filhos, tinha meses de vida, e ele lhe escrevia cartas cheias de carinho e tentando educá-lo a distância, muitas estão guardadas até hoje. Ele tem um pequeno livro impresso que relata parte de sua vida, simples, lindo e emocionante. Acho que puxei pra ele essa mania de desabafar escrevendo. Dos "causos", sempre lembro do trem que ele pegou e as pessoas quiseram lhe expulsar, sendo que as únicas a defendê-lo foram as prostitutas, e ele deixou isso registrado para mostrar que elas, tão desprezadas e julgadas, se mostraram muito mais humanas que qualquer outra pessoa. A seu Sebastião de Paula Braga, minha eterna admiração e um sentimento forte de saudade de quem nunca olhei nos olhos.
Se o avô paterno teve que se ausentar, minha admiração dobrada para a mulher que aguentou tudo sozinha, minha vó Ritinha. Já ouvi diversas vezes que me pareço com ela, branquinha, dócil na aparência, mas extremamente exigente e brava quando mexiam com ela ou com sua "cria". Com o afastamento do meu avô, os familiares quiseram separar seus filhos, alegando que ela não conseguiria cuidar de todos sozinha. Dizem que ela virou uma onça e não aceitou de maneira alguma. Passou a costurar para ganhar a vida, meu pai pequeno lhe ajudava a fazer entregas, os filhos mais velhos começaram a trabalhar. Passaram inúmeras dificuldades financeiras, desejos de ter o que os primos tinham, não tinham sapato para calçar...mas se perguntar para qualquer um deles, todos dirão que ela tomou a decisão certa: a união da família em primeiro lugar. E em termos de educação, ela sempre foi muito rígida, e criou seres humanos exemplares, na minha opinião. Meu pai sempre conta que morria de medo de desobedecê-la, que uma vez estava na fazenda de seus avós e disse que voltaria tal dia, perdeu a hora nadando no rio e lá se foi o último trem. Voltou a pé, em uma estrada que se dizia mal assombrada, enfrentou "fantasmas" mas não enfrentou dona Rita. Valores passados a nós posteriormente, ou seja, um relacionamento baseado em confiança. Tive o prazer de conhecê-la, por 6 anos apenas, mas lembro do cheiro da sua casa, do sorriso ao me ver chegar (a caçula dos 17 netos), do orgulho que sentia do meu pai. À dona Rita Luz Braga, um sentimento forte de saudade e de vontade de ter convivido e aprendido mais com ela.
Ao espanhol "mala raza" do meu avô materno eu já até fiz um post exclusivo (http://feluzbraga.blogspot.com/2010/07/origem-do-meu-sangue-espanholole.html), a figura merece. Filho de espanhóis, era uma criatura muito agradável, de alegria contagiante, bem cabeça dura também, mas na maioria das vezes tinha razão, seu senso de justiça era implacável. Tinha mais pose de durão do que realmente era, no fundo fazia tudo para suas filhas, netos e esposa. Suas pérolas são constantemente lembradas na família. Dançava como ninguém...ah que delícia ter tido a oportunidade de tê-lo em minha valsa de 15 anos. Pouco tempo depois ele me ensinou a cheirar lança perfume em casa: "você vai encontrar por aí, e não quero que caia no salão quando for experimentar". Pode parecer um absurdo hoje, mas para ele era algo comum, veio de uma geração que conviveu com isso em bailes de carnaval como se fosse cerveja. Enfim, foi a única droga ilícita que experimentei até hoje...e devo em grande parte a ele, por ter "desmitificado" isso em casa, de forma natural, mostrando que não é nada demais, e que não precisamos disso para ser feliz. Teve a alegria nitidamente e eternamente abalada pela perda de sua filha do meio, por câncer em 1991, e desejou tanto morrer em seu lugar, que Deus o levou repentinamente em 1999. Dia de enorme tristeza, estávamos todos na estrada indo festejar com a família Luz Braga e voltamos às pressas. Ainda não assimilei muito bem esse dia, parecia um pesadelo. Ao seu Irineu Gomes, meus agradecimentos pelas sábias palavras e ensinamentos, e uma saudade sem fim.
Sabe aquela vovozinha fofa, que não vê defeito nos netos e que está sempre pronta para nos proteger? Essa é a dona Tita! Engraçadíssima, sempre adorou passar "trotes" nos amigos das filhas, se pintava de homem mal encarado, vestia máscaras e dava sustos na molecada no quintal. Adorava organizar festinhas de aniversário, imaginar vestidos e fantasias para os bailes, fazer biquinhos de crochê nas toalhas, não perdia uma viagem de carro em família, apesar de nunca ter dirigido. Quanto aos estudos, minha mãe repetia de ano e ela dizia "ano que vem você passa", e assinava nossas provas e bilhetes da escola quando precisava, com uma letrinha linda de menina. A casa dela em Nova Granada era uma delícia, reuníamos os primos nas férias, brigávamos pelas canecas que ela marcava com nossa inicial para não confundirmos, o cheiro de sua esfiha tomava conta da casa, e ela sempre enfiava um dinheirinho escondido nas nossas coisas. Os meninos aprontavam, chegaram até a colocar fogo no vaso de plumas da sala, mas ela sempre os defendia. Talvez por não ter tido filhos homens, os netos eram seus "preferidos", mas no bom sentido, pois nunca faltou amor para as netas, e nem enxoval (sim, tenho o meu guardado, amarelado já...rs). Após a morte do vô ela sofreu muito, não sabia se virar, era ele quem fazia tudo para ela. Foi morar com minha mãe, começou a ter dificuldade de andar, a levamos para um cruzeiro com o suporte de uma cadeira de rodas, ela se divertiu horrores, e eu mais ainda pois dividi a cabine com ela. Hoje, prestes a completar 91 anos, ela sofre com essa lamentável doença chamada Alzheimer. Está em um estágio avançado da doença, padecendo na cama, falando pouco, com quase nada de consciência. Mas de vez em quando ainda pergunta se casei (risos). Semana passada ouvi minha mãe dizer para ela "Mamãe, você não me reconhece, né? Mas o importante é que eu sei quem você é, viu...é minha mãe adorada....". Chorei muito. Triste vê-la nesse estado, mas é sempre bom vê-la, tocá-la, beijá-la. À dona Angelina Fonseca Gomes, todo meu amor e meus parabéns pelo seu dia, e eternos agradecimentos por ter sempre exercido o papel de avó brilhantemente, como manda o figurino.
Beijos a todos os avós...aproveito para parabenizar meus pais, Iraí e Roberto, pelos avós presentes, dedicados e amorosos que são!
Lindo demais Fer! Chorei, sem mais. Saudades de vc... (já casou? rsrsrs) Beijo
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